A greve e os truques do governo
26, julho, 2012Por Maurício Caleiro
À medida que vêm à tona análises mais detalhadas da proposta do governo Dilma aos professores em greve, fica cada vez mais evidente que se trata não apenas de uma resposta insatisfatória em termos salariais e de estruturação da carreira. Depreendem-se do episódio aspectos preocupantes quanto às estratégias comunicacionais adotadas pelo governo no episódio, no modo como ele concebe e se relaciona com o professor universitário no Brasil e, sobretudo, no que toca à posição da Educação ante a área econômica do governo, tendo em vista seu planejamento e perspectivas futuras. Ilusionismo financeiro Quanto aos aspectos propriamente salariais, claro está que a proposta do governo é de tal ordem sujeita a variações de dados macroeconômicos futuros e à definição exata de datas de reajuste – deixadas em aberto - que não se pode falar categoricamente em aumento. Pois, a depender da inflação de 2012, 2013 e 2014 e de como o governo dividirá percentualmente entre tais anos os reajustes salariais, estes podem ser anulados ou mesmo superados pelo aumento do custo de vida. Aumentos trienais sem garantia de percentual acima da inflação não significam a priori aumento real, mas uma aposta. Plano de carreira Em meio a brechas e indefinições potencialmente danosas, o mais contraditório desses aspectos é a determinação de que mesmo mestres e doutores devem ingressar no magistério superior como Professor Auxiliar, e que só podem evoluir após os três anos de estágio probatório. Ora, isso, além de não fazer o menor sentido, é uma afronta à própria expectativa de direito anteriormente assegurada àqueles que ora cursam mestrado ou doutorado, para os quais ingressaram, em sua imensa maioria, justamente para ascender à (ou ingressar na) classe referente à sua titulação. Papo reto Tivesse tomado essa medida trivial e apresentado um plano de carreira decente – obrigações básicas de qualquer governo, ainda mais de um que diz privilegiar a educação –, a greve já teria há tempos se encerrado. Ao invés disso, após mais de um mês de paralisação, rompe o silêncio e monta uma verdadeira operação de marketing para divulgar sua proposta – incluindo um texto em que dá destaque aos aumentos maiores, relativos à ínfima minoria dos professores titulares,e tabelas comparativas sui generis, que, numa manipulação injustificada e claramente mal-intencionada, contrapõem os salários de 2010 aos que os professores poderão vir a receber em 2015. Convém lembrar que estamos em 2012. Marketing e mídia (Como se vê, a cobertura que a mídia destina à greve fornece mais um exemplo claro de que a oposição simplista entre PIG (Partido da Mídia Golpista) e governo Dilma não é efetiva, como querem alguns. E que havendo afinidade de interesses entre mídia corporativa e governo, a imprensa não se furta a se posicionar ao lado deste. Deixa de ser o malvado PIG e vira jornalismo amigo.) Porém, a realidade fria dos números é bem outra. Para se aprofundar sobre os meandros da cobertura midiática, vale a pena ler os textos de Joana Tavares (no Vi o Mundo) e os de Sylvia Debassan Moretzsohn, “A lamentável cobertura da greve nas federais” (no post abaixo) e “O jornalismo cego às armadilhas do discurso oficial” (no Observatório da Imprensa). Equívocos e autoritarismo A impressão que fica é que o governo os toma por tolos, incapazes de fazerem contas financeiras ou de desvelarem truques de marketing de massas. Isso evidencia a existência de um erro de postura da administração Dilma, certamente menos decisivo e efetivo, na prática, do que as propostas que apresenta podem ser, mas denotadores, por um lado, de uma incompreensão profunda do que seja o professor universitário enquanto categoria profissional do Estado e, por outro, uma vez mais, da tendência a evitar o diálogo e a negociação ou a exercê-los em bases mínimas e restritas - a um passo do autoritarismo, como a autorização para o corte de ponto dos grevistas evidencia. Contradições óbvias Mais: o mesmo governo que faz de tudo para irrigar a economia através da ampliação do crédito – portanto, de capital advindo de endividamento junto ao sistema financeiro, que acaba por se traduzir em lucro para os bancos – parece não querer irrigá-la com salário – capital originário das relações sociais do trabalho, que teoricamente beneficiaria o assalariado (e, ainda mais, quem o emprega), mas que, na visão economicista predominante, eivada de premissas (neo)liberais, prejudica o governo por aumentar seus gastos. Tire suas conclusões |
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