Não à desoneração da Previdência!
27, julho, 2012Por Paulo Kliass
É impressionante a capacidade do governo em atender rápida e prontamente aos pleitos do grande capital nacional e estrangeiro. Vira e mexe, entra na pauta da negociação política algum item novo ou mesmo requentado, fruto da ação dos lobistas das associações patronais. O objetivo, como sempre, é aumentar os ganhos nas operações das empresas e ampliar o volume da acumulação privada. Nada contra que cada setor da sociedade se articule e saia a campo para defender seus interesses específicos e corporativos. No entanto, deveria caber aos responsáveis da administração pública a capacidade de filtrar e analisar com mais cautela esse tipo manjado de demanda. Afinal, imagina-se que o prioritário deva ser o atendimento às necessidades da maioria da população e não apenas ficar se rendendo às chantagens ou aos cantos de sereia dos poderosos. Liberalismo empresarial: crítica ao Estado e pedido de recursos públicos. Ora, não há dúvida de que a nossa formação social apresenta heranças históricas e outras características específicas que contribuem para torná-la menos eficiente do que poderia. Os exemplos são inúmeros: o verdadeiro cipoal de tributos existentes entre os 3 níveis da federação (União, Estados e Municípios), o grau excessivo de “cartorialismo” e “regulamentacionismo casuístico”, a tendência do poder público a apresentar empecilhos e dificuldades à ação dos indivíduos e das empresas, entre outros. No entanto, a solução passa por aperfeiçoar esses procedimentos institucionais, tornando-os cada vez mais justos e republicanos. É importante reduzir a regressividade de nossa estrutura tributária, onde os que têm menos renda e menos patrimônio pagam, proporcionalmente, muito mais impostos do que as camadas do alto da pirâmide social. É fundamental melhorar o gasto público e tornar a ação do Estado mais eficiente, de maneira que a gestão pública ofereça serviços de qualidade para a maioria da população. E não apenas ficar papagaiando o discurso pseudo-liberal a respeito da diminuição do tamanho do Estado e da tão propalada redução da carga tributária. “Custo Brasil” e o salário mínimo: discurso e realidade O exemplo mais cristalino da falácia dessa forma viesada de analisar a dinâmica sócio-econômica é o caso do próprio salário mínimo. Está muito presente na memória coletiva a enorme resistência dos empresários e dos governantes em aceitar um pacto social que incorporasse a melhoria das condições de vida de nosso povo e da distribuição de renda via recuperação do valor real do salário mínimo. Não obstante os cálculos do DIEESE demonstrarem quão longe estamos do que valor correto dessa remuneração (em junho seria de R$ 2.383), uma antiga proposta do deputado federal e depois senador Paulo Paim (PT/RS) era alvo de chacota e de ataques políticos. Imaginem a ousadia! Propor que o salário mínimo em nosso País atingisse o equivalente a US$ 100. Que absurdo! Isso iria quebrar o Brasil! Uma verdadeira irresponsabilidade de sindicalista fora de órbita! E por aí seguiam as acusações iradas. Pois os anos se passaram e aos poucos a política de revalorização do salário mínimo e a melhoria das condições macroeconômicas (auxiliada também pela valorização da taxa de câmbio) fizeram com que o salário mínimo de R$ 622 seja equivalente, hoje em dia, a mais de US$ 300. E nenhuma daquelas previsões catastrofistas se confirmaram. Muito pelo contrário, aliás. O salário mínimo aumentou bastante de valor. E o capital está belo e contente, faturando como há muito não fazia, em razão da ampliação do mercado interno consumidor. Mas se dependesse daquela abordagem liberalóide da flexibilização e da redução dos custos associados ao trabalho, hoje deveríamos estar com salários no patamar dos chineses. De acordo com esse raciocínio perverso e reducionista - aí, sim! – então seríamos uma sociedade economicamente eficiente e competitiva. Uma loucura! Desoneração da folha: perigo para a Previdência Por aqui, infelizmente o governo acabou cedendo a esse tipo de pressão e se submeteu a uma espécie de “experiência de laboratório”. Como se um modelo de elevada sensibilidade social e de efeitos a se fazerem sentir de geração em geração pudesse ser tratado dessa forma leviana e irresponsável, quase na base da tentativa e erro. O fato é que um conjunto expressivo de setores não está pagando mais a contribuição previdenciária da forma acima descrita. Passaram a recolher uma alíquota variável (entre 0,5% e 2%) sobre o faturamento das empresas e o próprio governo reconhecia, em abril passado, que tal medida iria implicar um custo anual extraordinário de R$ 7,2 bi ao Tesouro Nacional. Ou seja, apesar de não haver recursos para todas as demandas de natureza social, mais uma vez se evidencia que sempre sobram verbas para sair em socorro do grande capital. A generalização da experiência setorial As contas do governo continuam completamente obscuras nesse quesito e ninguém sabe ao certo se esse novo modelo de base arrecadadora se sustentará no médio e no longo prazos. E o problema é que o processo de extensão foi acelerado. Aquilo que inicialmente foi lançado apenas como uma experiência, agora - apenas 3 meses depois! - já se apresenta como uma solução supostamente definitiva. No começo de julho, em reunião com a nata do capital na sede da FIESP e com o Grupo de Líderes Empresariais (LIDE), o Ministro Mantega não poderia ter sido mais claro: “Qualquer setor que estiver interessado na desoneração da folha, representado por sua entidade, deve entrar em contato conosco.” E ainda saiu-se com a pérola: “Temos de reduzir o custo da mão-de-obra”. Previdência equilibrada e os riscos para o futuro Assim, vê-se que isso não tem nada a ver com problemas de ineficiência da Previdência Social. Foi uma decisão importante do País adotada à época e os recursos devem ser contabilizados à conta do Tesouro Nacional. Na verdade, as manchetes garrafais estampando o falso “déficit da previdência social” servem apenas para desacreditar de forma criminosa o modelo. Caso sejam incorporados ainda os valores não pagos por segmentos beneficiados e instituições filantrópicas – além das dívidas judiciais não pagas – o sistema vai muito bem, obrigado. Tanto que o subgrupo dos trabalhadores urbanos é superavitário: arrecada mais do que gasta com benefícios. O risco da via adotada pelo governo na desoneração da folha é o da política do fato consumado. Se os empresários estiverem satisfeitos com o novo modelo, será difícil realizar uma volta atrás, caso o novo modelo de contribuição se revele incapaz de dar conta de suas destinações para o RGPS. Ao mesmo tempo em que inicia a reforma previdenciária por temas polêmicos e sensíveis de despesa (fator previdenciário, tempo de contribuição, idade mínima, etc), o governo altera profundamente o mesmo sistema pelo lado da arrecadação – as receitas. Mais uma vez, oferece todo o tipo de bondades aos representantes do capital e deixa a conta das maldades para ser paga - no futuro - por trabalhadores, aposentados e pensionistas. |
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