Envie para um amigo



Fale com a Diretoria

Tem alguma dúvida? Precisa saber sobre alguma demanda como filiado? Quer contribuir com sugestões, ideias ou críticas?

Envie uma mensagem para a DS Ceará. Queremos ouvir você!




O fracasso do “novo” paradigma negocial

16, outubro, 2008

Por Paulo Gil Hölck Introíni
Presidente da DS Campinas do Unafisco Sindical

Há cerca de um ano, na primeira plenária conjunta dos Auditores Fiscais, um dos membros da direção nacional do Unafisco dirigiu-se aos presentes e anunciou em tom enfático a mudança de um paradigma. “Antes, ficávamos 6 meses em greve, para aí então, começarmos a negociar com o governo”; agora, não fizemos greve alguma e já temos uma proposta” . Referia-se ele à “proposta” anunciada pelo governo em 17 de outubro. “Isto porque”, continuou ele, “temos agora o novo paradigma negocial”.

O convicto diretor fez seu discurso pouco antes do almoço. Já no início da tarde, a direção, constrangida, teve que avisar a todos que o governo cancelara a reunião. Foi o prenúncio de que a “grande conquista negocial” iria naufragar. O que aconteceu depois, todos sabemos. A direção viu-se obrigada a fazer o que não sabia: organizar a categoria para a luta. E, obviamente, fracassou. O novo paradigma negocial revelou-se uma fraude.

Ainda que às avessas, o episódio, cômico na forma e dramático na essência, foi também pedagógico para a categoria, porque é emblemático de certas práticas das direções sindicais que caminham na contramão do sindicalismo combativo, independente e democrático.

Não se pode dizer que essas práticas são novas. Se por um lado, a análise histórica nos mostra que não há conquista sem luta, de outro, nos alerta para os estragos do sindicalismo pelego, sempre alinhado com os interesses do patronato. No setor público aprendemos que nossos direitos foram conquistados e preservados com muita luta. Mas também encontramos as exceções, aquelas direções sindicais e, principalmente, associativas cujo principal papel têm sido o de viabilizar a implantação de políticas de governo que reduzem direitos dos servidores e afrontam o interesse público.

Tampouco é novidade o sindicalismo negocial, importado ao Brasil sob o nome de sindicalismo de resultados. Não está tão longe o tempo em que Magri e Luiz Antonio Medeiros anunciavam esse “novo paradigma”. “O sindicato é um fator de mercado”, dizia Medeiros em 1987, quando assumiu a direção do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo. Alguns anos depois, ambos criavam a Força Sindical (1991), se contrapondo ao sindicalismo combativo, sob os aplausos das lideranças empresariais da Avenida Paulista, que encontraram uma alternativa confiável diante da decomposição do peleguismo tradicional. É marcante a análise de Júlio Lobo, assessor da FIESP à época: "Os patrões querem cooptar interlocutores legítimos do lado dos trabalhadores, de forma que as medidas cruéis, que devem ser tomadas, não causem turbulência além das usuais. É a parte mecânica. Ideologicamente a aproximação com Magri e Luiz Antonio é óbvia. Eles têm idéias mais próximas do pensamento empresarial" (Jornal da Tarde, 10.07.87).

Medeiros sucedeu Joaquim dos Santos Andrade, o Joaquinzão, que permaneceu por mais de 20 anos na direção da Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo. Joaquinzão havia sido interventor do Ministério do Trabalho na direção do Sindicato dos Metalúrgicos de Guarulhos, durante a ditadura militar. E Antonio Rogério Magri, por 12 anos presidente do Sindicato dos Eletricitários, foi seu par na linha de frente do sindicalismo de resultados.

Aliás, é bom dizer, estamos falando do sindicalismo de maus resultados. Mesmo do ponto de vista da reivindicação meramente econômica, o resultado do sindicalismo combativo sempre foi melhor. Do ponto de vista dos direitos mais importantes, o chamado “sindicalismo de negócios” (business union), prestou um desserviço a todos os trabalhadores ao abraçar as teses neoliberais, na teoria e na prática. Durante a Constituinte, os representantes desse sindicalismo pressionaram os parlamentares contra a redução da jornada de trabalho e a estabilidade no emprego. Em 1993, a Força Sindical apresentou um Projeto para o Brasil, formulado por uma equipe coordenada por Antonio Kandir, o mesmo que coordenou o projeto de Collor. A Força apoiou a eleição de Collor e seu governo. Já quando as coisas estavam praticamente definidas, apoiou o impeachment na condição de que fossem mantidas as reformas do presidente da Casa da Dinda. Apoiou as privatizações e defendeu o fim da estabilidade dos servidores públicos.

Medeiros, quando surgiu, trabalhou a imagem de herdeiro do que havia de melhor em Joaquinzão: a sua habilidade de negociador. É de Medeiros a declaração: “o confronto não leva a acordos, e só o acordo leva à melhoria das condições de vida e trabalho”. Já a afirmação seguinte é da DEN do Unafisco: “O que se conseguiu através do embate direto como única forma de ação foram perdas salariais e desvalorização do cargo.” (editorial do Boletim Informativo de 05 de setembro de 2008). Qualquer semelhança é de responsabilidade de ambos. A interpretação invertida da história, também.

O sindicalismo negocial tem como objetivo principal valorizar os próprios negociadores, que se resumem a alguns dirigentes. Por isto, a ênfase na representação em vez da participação da categoria. Pretende, sem sucesso, substituir a força organizada de muitos pela habilidade de negociar de poucos. Despreza a ação coletiva, o elemento mais forte e consistente na conquista de direitos. Ao fazer isto, manifesta sua característica mais nefasta: a exclusão dos trabalhadores dos processos de decisão efetiva.

Para não dizerem que não falamos dos resultados, no universo dos auditores fiscais, o sindicalismo negocial produziu alguns: o SIDEC, inteirinho da Silva e vestido com o modelito gerencial, sinal mais evidente de que não houve transparência na negociação ou o governo ignorou os “hábeis negociadores”; às vezes a esperteza engole os espertos. Outro resultado significativo foi dar um fôlego adicional ao cambaleante PROPESSOAS e ao projeto de poder de seus formuladores. E embalados pela crença pia de que autoridade fiscal se fortalece com gravata, pim, elevador privativo e foro privilegiado para julgamento de crimes comuns, os adeptos do novo paradigma também jogaram muita água no moinho da Lei Orgânica da antiga Administração que, em síntese, autarquizava o órgão e previa a transferência das atribuições dos auditores aos ocupantes de cargos de confiança.

Assim como o sindicalismo de resultados surgiu para combater o sindicalismo combativo, o “novo paradigma negocial” veio para combater a legitimação social. E veio com apoio decisivo da Administração superior do órgão, de triste memória. Os “inovadores” não conseguiram ou não quiseram perceber que só resistimos aos fortes contra nossas atribuições porque construímos redes de solidariedade com a parcela ética e cidadã da sociedade organizada. Não fosse um extraordinário processo de legitimação social nossa condição de autoridade a serviço do interesse público estaria definitivamente sepultada.

Anunciado e praticado o novo paradigma, nunca estivemos fragilizados em nossa organização sindical, tão apartados do conjunto do movimento social, tão isolados na sociedade.
No Boletim Informativo de 05 de setembro último, a DEN reafirmou sua crença no paradigma que pensa que inaugurou, ao proclamar corajosamente “Apesar do governo, DEN mantém aposta na via negocial”. Eles admitem que foi uma aposta. Falta admitir que perderam e que o preço foi pago por toda a categoria, pela Receita Federal e pelo País.

O sindicalismo que precisamos não reinventa a roda e não revoga a história. Baseia-se em princípios consolidados da boa prática sindical: democracia interna, independência, autonomia, ética, solidariedade e legitimação social.