Privatização dos aeroportos: capitulação surpreendente
10, fevereiro, 2012Por Gilberto Maringoni
Belo Horizonte, 28 de novembro de 1999, fim de tarde. A maioria dos delegados eleitos para o II Congresso do Partido dos Trabalhadores aprova uma série de resoluções reunidas no documento O Programa da Revolução Democrática para a construção de um Brasil livre, justo e solidário. Entre elas, uma diz o seguinte: As privatizações têm representado uma gigantesca transferência de renda do setor público para o privado. Os preços de venda foram aviltantes, muitas vezes financiados com recursos do Estado. Os efeitos sobre o crescimento da economia são inexistentes, com resultados irrelevantes no abatimento das dívidas interna e externa. (...) O PT reafirma sua posição pela suspensão imediata do Programa Nacional de Privatizações. Em 2010, utilizando discurso semelhante, a então candidata Dilma Rousseff fulminou seu adversário José Serra no debate da TV Bandeirantes, como se vê neste vídeo. Acrobacias ideológicas O mercado e a mídia comemoram. E os petistas tentam justificar as acrobacias em suas teses. Os líderes do partido se esmeram em um admirável contorcionismo verbal para dizer que não é bem assim, que não se vendeu nada, o que aconteceu foi uma concessão, o patrimônio continua público, as tarifas vão cair e que o feito demonstra a confiança que nosso país granjeia diante de um mundo em crise. O deputado Marco Maia (PT-RS), presidente da Câmara, se superou. Suas palavras foram captadas pelo jornal O Globo: “Uma coisa é privatização no setor de energia, de mineração, outra é tratar de concessão em setores que não são tão importantes, estratégicos para a economia. Os aeroportos não têm valor tão estratégico”. É impressionante! Para os Estados Unidos, país do liberalismo, os aeroportos são tão vitais que toda a gestão é estatal. E se aqui não têm não têm valor estratégico, para que toda a preocupação com caos aéreo, pane nos serviços durante a Copa e presença do BNDES no leilão? Caso o pensamento de Maia prospere, estará absolvida a maioria das privatizações dos governos FHC, realizadas sob o regime de concessão e financiadas também pelo BNDES. As desestatizações das empresas de energia, telefonia, saneamento, gás e transportes (ferrovias) foram realizadas através de concessões por tempo determinado. Nada garante que investimentos virão, como chegou a dizer o deputado José Guimarães (PT-CE), assim como não chegou dinheiro novo para modernizar a rede elétrica e a de telecomunicações. No caso da banda larga, por exemplo, as concessionárias só investirão na ampliação do serviço após uma série de desonerações tributárias patrocinadas pelo governo . Aliás, a experiência recente mostra que as empresas estrangeiras concessionárias de serviços públicos preferem remeter lucros às suas matrizes em dificuldades a colocar recursos nas subsidiárias brasileiras. Capitulação petista A concessão dos aeroportos não tem base em argumentos objetivos. O Estado tem dinheiro. Mas 47,19% de seu orçamento é direcionado para o pagamento dos juros e serviços da dívida pública, de acordo com dados da organização Auditoria Cidadã. Por trás da cessão á iniciativa privada está a velha idéia de que o mercado é superior ao Estado para administrar o que quer que seja. E que precisamos de firmas estrangeiras –superiores a nós - para gerir também o que quer que seja. Em síntese, volta o mercadismo e o complexo de viralatas. Esta é a grande disputa feita ao longo dos últimos anos na sociedade brasileira. E é também o grande prejuízo – ideológico, para repetir um conceito tido como fora de moda – cometido pelo governo federal. O PT confessou com grande alarde uma capitulação às teses de seus adversários. Capitulação inexplicável, por dois motivos: 1. Acontece quando o PSDB vive sua pior crise de rumos e de falta de lideranças e 2. É feita quando as idéias básicas do neoliberalismo são desmoralizadas pela crise européia. Capitalização tucana Mais objetiva ainda foi a economista Elena Landau, uma das principais formuladoras das privatizações dos anos 1990, em seu twitter: “Hoje é dia muito importante: o debate sobre privatizações se encerrou... E nós ganhamos”. O PT cresceu muito, tornou-se o maior partido brasileiro, ganhou as três últimas eleições presidenciais e provavelmente ganhará a próxima. Mas entregou os pontos na batalha das idéias. Gramsci chamava isso de “transformismo”. Seja o que for, é triste. Este artigo reflete as opiniões do(s) autor(es), e não necessariamente da Delegacia Sindical do Ceará. Esta Delegacia Sindical não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizada pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações. |
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