Os problemas que afetam o sindicalismo contemporâneo e o surgimento da figura do novo trabalhador coletivo
17, maio, 2013O cientista social, Emílio Gennari, iniciou sua palestra na Oficina Sindical da DS BH, realizada no último dia 9, levando a categoria de Auditores-Fiscais a refletir sobre o conceito de sindicato como entidade que exerce a função de SIM, ou seja, não se trata de uma sala de um prédio, um endereço, um telefone, um sitio na internet ou um conjunto de lideranças esforçadas. Sindicato é um conjunto de servidores que se organizam para defender seus interesses, os seus direitos e que depende da participação de todos para consecução do seu fim.
“O sindicato hoje está em crise”, afirmou o palestrante quando explicou que nas últimas duas décadas, principalmente na iniciativa privada, foram retirados dos locais de trabalho as pessoas que estavam envolvidas com o sindicato e que promoviam discussões e debates políticos nos ambientes institucionais. A classe trabalhadora passou a não mais discutir política, saúde e educação e, com isso, ficou muito mais fácil moldá-la para que fosse possível limitar as pautas reivindicatórias e o paulatino esvaziamento dos sindicatos.
A partir da década de 1990, houve a tentativa de fazer com que o trabalhador fosse cada vez mais “parceiro” dos empresários. A luta por direitos começa então a se perder em nome de uma parceria que, apesar das aparências, sempre atendia às exigências da empresa. Tal medida, segundo Gennari, também contribuiu consideravelmente para o enfraquecimento do sindicato e reduziu a ação sindical ao âmbito econômico corporativo: nada de discutir políticas públicas que contrariem a visão institucional, ou seja, a luta passou a se resumir a salário, jornada e condições de trabalho.
O “novo trabalhador” passou a ser domesticado para agir conforme as exigências do capital, pois lhes eram dadas diversas “conquistas” ao agirem em parceria com o empregador e, coletivamente, o sindicalismo também entrou nessa onda. As próprias empresas passaram a substituir os sindicatos nas negociações e a identidade de categoria que luta em defesa dos direitos começou a se perder em nome de uma parceria que se submete às crescentes demandas das empresas.
Esse novo trabalhador pensa individualmente e não consegue dialogar com seus pares, ele fala outra linguagem. Como consequência, o afastamento e o isolamento, que dificultam os processos de luta.
Os trabalhadores foram transformados, de acordo com Gennari, em unidades de consumo, o chamado “ter para ser” como passaporte para a visibilidade. O trabalhador não precisa mais estar com os demais e lutar em conjunto, ele passa a buscar espaço para sua própria afirmação, independentemente do coletivo. Um trabalhador preocupado apenas com seus conflitos individuais que não percebe que os seus problemas também podem ser sentidos pelos seus semelhantes.
“O novo trabalhador perdeu a capacidade de ver a sociedade organizada de outro jeito e nem acredita que a sua intervenção possa fazer a diferença no local de trabalho. O perfil de trabalhador cada vez mais focado na sua empregabilidade, em correr atrás de condições que garantam o seu sucesso pessoal no trabalho. A sua realização profissional depende exclusivamente dele, individualmente”, destacou Gennari.
Em relação ao sindicalismo de servidores públicos, Gennari explicou que o mesmo está sozinho e “com as pernas bambas”: levado ao isolamento e realizando lutas que a sociedade não compreende. A sociedade desconhece a legitimidade de suas lutas e condena aquilo que é público e aplaude o que é privado. “Vocês Auditores-Fiscais estão isolados sem a possibilidade de realizarem alianças, pois os demais setores da classe trabalhadora possuem uma leitura de realidade de maneira segmentada e não estão interessados em compartilhar lutas”, afirmou.
Por outro lado, o que também dificulta o movimento sindical atualmente é que, aqueles que exerciam posições de liderança hoje são os mesmos que negociam com os trabalhadores. Eles conhecem as falhas e os defeitos do movimento sindical, sabem quando o movimento tem condições de sobressair-se ou não. “Eles sabem como desmontar a máquina. Parte das lideranças não existe mais e quem existe está do outro lado da negociação é aquele que ontem lutava contigo” disse o palestrante.
Cumprimento de metas, crescente redução de condições de trabalho, aumento da carga e alto índice de ocorrência de assédio moral são alguns dos problemas que afetam o funcionalismo público atualmente, mas os trabalhadores não reagem. A defesa do posto é mais importante do que qualquer outra defesa, ou seja, as pessoas estão cada vez mais distantes umas das outras nas relações trabalhistas. O sindicalismo está como um general sem exército.
Sobre esses problemas Gennari orientou: “aprendam a dizer NÃO e reconstruam elementos para aproximar as pessoas e levá-las a pensar sobre a sua realidade de trabalho. É preciso desenvolver um pensamento de indignação sobre essa situação, pois o pensamento de indignação nasce da percepção da injustiça. Se não há injustiça, não há indignação”, ressaltou.
O sindicato precisa ter interesse nos problemas da coletividade e ajudar as pessoas a se envolverem e pensarem o caminho da luta. No entanto, cabe a cada trabalhador estar organizado e ter a consciência de que algo precisa ser feito junto, coletivamente. Não se deve simplesmente delegar para a liderança, buscando tão somente um culpado para um problema que é de todos.
Gennari aconselhou a categoria a se posicionar e definir seus reais objetivos, escolhendo o ponto mais fraco na força do seu inimigo, promovendo debates e diálogos constantes com a sua base, não se esquecendo de estimular aquele sentimento de indignação. “O novo trabalhador não aceita linguagem racional, tem que tocar o coração dele”, disse.
Para concluir sua exposição, o palestrante ainda orientou: construa dúvidas, perguntas, leve as pessoas a pensarem. Sei que o processo é difícil, mas não é impossível. Ajude as pessoas a construírem um sentimento de coletividade, de solidariedade umas para com as outras. Cultive espaços informais, quebrem o gelo nas relações. “O verdadeiro líder é um de nós, ele está do nosso lado, mas nós precisamos ajudá-lo no processo de condução do movimento sindical”.
“Minha visão em relação ao futuro do movimento sindical é bastante otimista. Acredito sim que o sindicalismo tem futuro e ele está na nossa capacidade de interpretar os acontecimentos, intervir, dialogar e mudar, para apontar novas construções e um futuro melhor para todos. Quem constrói o novo amanhecer somos nós. Se não assumirmos essa tarefa, continuaremos no escuro”, concluiu Gennari.